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Poeta catarinense
com dedos podres
e mania de flâneur

Autor de "Cá Entre Nós -
Odes de Alusão e Ilusão"

DAS MORTES


À sua passagem
as portas se escancaram
por si mesmas.

Ela atravessa as paredes,
adentra até as alcovas reais,
flagra os ladrões, os cônsules
e os xás, em suas secretas bacanais.

Senta-se à sua mesa e lhes serve bebidas.
Distribui sorrisos nos seus cantos,
exibindo seus dentes sem gengivas.

Cabelos frios que não são seus
cobrem sua cabeça por debaixo
do manto.

Adornos desbotados
e mortalha de farrapos.

Seu caminhar não é mais lento:
ela corre. Açoita as ancas
de um lívido cavalo.

Está com pressa. Alguém,
em algum lugar, fez o chamado.
Ela goza de indiferença.

À sua passagem,
um choro noturno lhe saúda.
Velhas senhoras devoram velas.

E tudo se transforma
nas herméticas famílias,
nos palácios imperiais,
nos balcões da providência.

E tudo ocorre de modo
mais ou menos parecido
nos jardins de inverno,
nos bares ou nos recitais.

À sua passagem,
um coro de uivos
a cortejá-la.

Ela adentra, soturna,
deslizante como um réptil.
Não adota critério algum
e nem faz distinções.