Eis uma página
em branco, irrevogável,
à revelia do poeta.
E tão cheia de si
que dispensa
qualquer palavra.
Despreza o gingado
do verso criado solto
pelas beiras do mundo.
A página-hiato —
Página-pausa —
Página-lapso —
A página intacta –
repleta de ausências
feito cama bem-feita.
Página incólume –
muito bem resguardada
de qualquer mancha.
Sorumbática
página-espelho
a expor o vazio
de quem a contempla.
Reticente e taciturna.
Hipnótica como guizo
de serpente.
Página-fenda
de cavidades
de árvore oca.
A página áspera —
Página abrupta —
De camadas
e de segmentos
e cujo fundo não se vê.
Mas há o ruído
o forte impacto
da pedra não lançada.
Ouve quem puder.
Na página desabitada –
página-poço oculta
por heras.
Página-presságio
de nada,
augúrio de coisa
nenhuma.
Página-percalço —
desacerto — desvio
de percurso.
À página convicta
de seu próprio vazio
o texto é uma agressão.
A narrativa
é um conluio.
Autor já não há.
Palavras ferem
a pele de papel
a fundo e com força.
Arranham seu corpo,
rasgam seus cantos,
pesam em suas orelhas,
atravancam seus rodapés.
Prestes a ser página,
optou por deixar de ser.
Agora,
ponte pênsil
tremelicante
sob um rio
fictício.