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Poeta catarinense
com dedos podres
e mania de flâneur

Autor de "Cá Entre Nós -
Odes de Alusão e Ilusão"

OS VULTOS

Começa a anoitecer
no apartamento:
as poses distintas
são hoje do mesmo homem.
Decido catar eu mesmo
                  as guimbas.
    Abafo o manequim,
recolho o maço de fotos.
Lembrar de mim: a noite
é um evocar de vultos.
Olho ao redor
com olhos vinte anos
              mais velhos.
Lembro de mim
vexador atravessando
o salão do bar-restaurante
feito uma Lisa Fonssagrives
                     em pleno trote.
Gazela altiva - pezinhos
em ponta - olhar enviesado.
Nem um passo incerto
ao lembrar de mim
     de pé junto ao
                 timão
à bordo da galena
dos boquiabertos.
Cortando ares,
mares, selvas
        e areais
desconquistas,
dissoluções,
desacessos.
À noite, aos pares,
os vultos se enfileiram.
Lembro de mim,
narinas queimadas,
poppers e parafernálias.
a tomar apontamentos:
               conhecer-se
            no desejo 
          do Outro
         é tomar 
          do Outro
          o desejo 
      por si.
E começar a anoitecer
         no apartamento
como se a noite fosse
um constante lembrar
                     de mim.
Algo se mexe
ao fundo da sala.
Passa por mim como se
           me atravessasse.
Noto pelos cantos
dos olhos. Está aqui.
Algo estar aqui e a noite ser
invólucro de vultos,
desfile de sombras.